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Café: extra-forte


futuro ancestral, ailton krenak

Há determinados livros em que é preciso voltar e não demoramos a perceber quais são eles. Assim que começamos as primeiras páginas, já percebemos algo importante que nos toma de vez. Futuro Ancestral, de Ailton Krenak, com esse título tão lindo quanto profundo, é um deles.

Aílton Krenak é um autor conhecido por seu trabalho no campo dos direitos indígenas e que se torna, a cada dia, mais relevante para todos. Com a crise indígena acentuada no Governo Bolsonaro, especialmente na Terra Indígena Yanomami, ele torna-se não apenas importante, como urgente. Em seus textos, Krenak traz uma dimensão da natureza de quem a vive de perto e em profundidade. O ambientalista faz filosofia com uma linguagem acessível, direta e poética. Ler seus textos é encontrar uma roda de conversa ampla, empática e crítica sobre nós mesmos enquanto humanos e brasileiros, e sobre como ainda desconhecemos muito do que somos feitos.

Em Futuro Ancestral, editado pela Companhia das Letras, encontramos 5 textos que tratam do nosso comportamento no mundo. Da Pandemia à educação das crianças e do respeito às idades e saberes, do respeito à própria infância, fala também da matança dos rios e das construções das cidades que insistem em separar 'meio ambiente' de 'civilização', trata ainda da tragédia de Mariana e mais um tanto de coisas. Os textos estão conectados com essa ideia de futuro ancestral talhado no presente, uma ideia de que o tempo é o fluxo contínuo de trocas entre gerações, como ele cita a vida das crianças Krenak, que

anseiam por serem antigas. Isso porque, nas humanidades em que as crianças ainda têm a liberdade e a autonomia de aspirar mundos, elas valorizam muito os velhos. As pessoas antigas têm a habilitação de quem passou por várias etapas da experiência de viver. São os contadores de histórias, os que ensinam as medicinas, a arte, os fundamentos de tudo que é relevante para ter uma boa vida. É o que os quéchuas chamam de sumak kawsay e que foi traduzido para o castelhano como bienvivir, ou bem viver, em português. 

A conexão que se faz entre o jovem e o ancião é a de sabedoria de vida, conhecimento e respeito. O idoso é quem passou pela experiência de viver e, em vez de ser descartado como se faz na urbanidade, é reverenciado, é um exemplo a ser seguido e é quem compartilha conhecimentos. Esse trecho, quase ao fim do livro encontra ressonância em sua abertura, quase poesia em suas primeiras páginas:

Nesta invocação do tempo ancestral, vejo um grupo de sete ou oito meninos remando numa canoa: 

Os meninos remavam de maneira compassada, todos tocavam o remo na superfície da água com muita calma e harmonia: estavam exercitando a infância deles no sentido que o seu povo, os Yudjá, chamam de se aproximar da antiguidade. Um deles, mais velho, que estava verbalizando a experiência, falou: "Nossos pais dizem que nós já estamos chegando perto de como era antigamente".

Eu achei tão bonito que aqueles meninos ansiassem por alguma coisa que os seus antepassados haviam ensinado, e tão belo quanto que a valorizassem no instante presente. Esses meninos que vejo em minha memória não estão correndo atrás de uma ideia prospectiva do tempo nem de algo que está em algum outro canto, mas do que vai acontecer exatamente aqui, neste lugar ancestral que é seu território, dentro dos rios.

foto de ailton krenak ambientalista
Ailton Krenak
Quando começamos a leitura, encontramos o trecho e só ele já nos faz respirar melhor. Krenak traz formas de ver o mundo e de entender que é preciso reconhecer riquezas, tradições e o respeito pela natureza como algo intrínseco à humanidade e não à parte dela. Suas reflexões sobre urbanidade, cidadania e canalização dos rios, um contrassenso e o oposto do progresso real são precisas e urgentes. Aqui em Salvador, Bahia, por exemplo, há um grande volume de obras públicas, como a construção de avenidas e viadutos que acabam com a vegetação e ampliam a canalização dos rios, os tornando esgotos ou tapando seu acesso à luz, como para esconder poeira embaixo de um tapete. Os rios não podem ser os problemas das cidades, eles já existiam quando os assentamentos urbanos tomaram posse e é por eles que as cidades passaram a existir naquele local. Os alagamentos e enchentes não acontecem por causa dos rios, mas por um sistema de esgotamento ausente e despreparado, em um planejamento urbano ineficiente, para dizer o mínimo. A natureza sempre indica o que estamos fazendo errado de forma explícita, e é esse o ensinamento que precisamos.

Para além das ideias base, o livro é uma delícia. É dos que deveria despontar em provas de concursos, vestibulares, ENEM. È preciso educar com livros como esse, levar para a mesa de bar dos amigos, de jantar das famílias, de lanche nas escolas. Aqui em casa, o livrinho segue com tantas orelhas marcadas, que quase dobrou sua fina espessura. É muito o que reler e refletir, dividir com quem quiser, e como ele nos relembra:

Nossa sociabilidade tem que ser repensada para além dos seres humanos, tem que incluir abelhas, tatus, baleias, golfinhos. Meus grandes mestres da vida são uma constelação de seres - humanos e não humano.

Livro: Futuro Ancestral, de Ailton Krenak
Companhia das Letras, 2022. 130 páginas.

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Ano passado, reencontrei uma colega da época de escola que não via, possivelmente, desde a época da escola, no final dos anos 90. Maria Cecília mora fora do país e vínhamos nos acompanhando pelas redes sociais, estreitando uma amizade atrasada mas muito bem vinda neste momento de nossas vidas. Fomos a uma livraria, trocamos figurinhas literárias e ela me indicou este livro: Kim Jiyoung, nascida em 1982, de Cho Nam-Joo.

livro de kim-jiyoung, nascida em 1982, de cho nam-joo, pela editora intrínseca
Kim Jiyoung, nascida em 1982. Cho Nam-Joo, Editora Intrínseca
O livro trata de uma mulher, como o título indica, nascida em 1982 na Coréia do Sul, mãe de uma criança e casada. Ela largou o trabalho para ter a filha e ser dona de casa, um fato comum no país. O relato já começa com uma transformação da protagonista, narrado na terceira pessoa. Kim Jiyoung parece estar tendo algum tipo de dissociação, muda de personalidade subitamente quando conversa com o marido ou familiares e se posiciona como nunca havia feito antes. A tendência, na Coréia do Sul, é que as mulheres tenham uma postura mais submissa e devotada à família, a aceitarem o pesado fardo da criação quase unilateral dos filhos e assumirem toda a responsabilidade dos cuidados da casa e das tradições familiares.

Entretanto, Kim Jiyoung cansou. De alguma maneira, seu comportamento estranho, o esgotamento do sujeito, é percebido nitidamente sob a forma de um desequilíbrio mental e o marido foi sozinho ao psiquiatra falar sobre a esposa e tratamentos possíveis. Entenda aqui, ele foi sem ela ao psiquiatra, porque a ela não importa saber de si.

O livro é excepcional e a vontade é de sair descortinando ele todo por aqui, conversando sobre cada situação que se apresenta, inclusive sobre a escolha narrativa que se explicará mais adiante - o fato do narrador não ser a própria Kim Jiyoung. Nada disso é à toa, o que torna a obra curta demais para sua qualidade.

Falar sobre o papel da mulher, em quase qualquer sociedade, é dialogar sobre imposições do patriarcado e suas tentativas de rompimento dessa estrutura arcaica. O livro encontra um caminho interessante porque traz um exemplo que está na ordem do ‘comum’ e envereda pelo fantástico com as ‘personalidades’ apresentadas da protagonista. A justificativa para esta solução é clara, marca a ausência de subjetividade imposta às mulheres daquela cultura para serem cumpridoras de tarefas domésticas, executoras apenas, sem reflexão, vontades, reclamações, afeto. Então, a partir do momento que Kim Jiyoung deixa de ser quem é para aquele microcosmo - e talvez pra si, ela assume as personalidades de todas as mulheres.

A obra não se restringe ao fato que abre sua história. Ela cria um panorama para que entendamos como é a vida de Kim Jiyoung, de seu nascimento ao momento em que tudo acontece. Assim, acompanhamos um relato que trata do seu nascimento, da situação familiar, dos privilégios do filho homem, das atribuições dela enquanto mulher, da adolescência, dos assédios e da perpetuação dos privilégios masculinos. Além disso, inclui dados estatísticos de comportamento e sociedade, criando quadro realista do que é ser mulher na Coréia do Sul dos anos 1980 para frente.

O livro é baseado na vida da autora, Cho Nam-Joo, que deixou o trabalho para se tornar mãe, e seus um milhão de exemplares vendidos no mundo em 18 idiomas atestam sua relevância e como ela se comunica em diferentes culturas que, não coincidentemente, abraçam algumas características semelhantes de comportamento e sociedade. Em pouco mais de 170 páginas temos tudo isso com um final excepcional. Boa leitura!


Livro: Kim Jiypung. nascida em 1982, de Cho Nam-Joo
Editora Intrínseca, 2022. 172 páginas.
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O prêmio Nobel de Literatura costuma me instigar a conhecer os autores ali consagrados. Alguns são historicamente conhecidos em nosso país, em sua grande maioria, homens. Minha curiosidade aumenta quando o prêmio é dado a uma mulher. Por um conceito ou preconceito, tendo a achar que as mulheres ganhadoras do Nobel de Literatura são ainda maiores do que os homens fotografados por ali, levando em conta que ultrapassaram o gênero que ocupa quase todo o cânone e historicamente por eles selecionado. De uma forma ou de outra, acabo de ler O Lugar, de Annie Ernaux, a vencedora do prêmio deste ano e é dessa descoberta que vamos falar.

annie-ernaux-nobel-o-lugar

Fui investigar os livros da autora e, sem ler muito sobre, peguei este O Lugar. A minha alegria veio imediatamente quando entendi o teor de suas obras. Annie fala sobre memórias, família, história. São temas que me atraem naturalmente, por eu mesma carregar essa vontade de conhecer famílias, histórias de vida, possibilidades de viver onde quer que se esteja. Quando um autor puxa esse assunto, especialmente com a qualidade literária que ela traz, é como se entrássemos naquela família, vivêssemos parte daqueles sentimentos e, mesmo se tratando de uma realidade que nos é distante de muitas maneiras, nos aproximamos dela com o que temos fundamentalmente em comum: nossa humanidade. 
"Busco a figura do meu pai na maneira como as pessoas se sentam e se entediam nas salas de espera, como falam com seus filhos, como se despedem umas das outras na plataforma da estação de trem." 

Em O Lugar, Annie me levou para um território assombroso, dos que eu mais temo na vida: a morte. Ela conta a história de seu pai, do homem que foi, do tempo que viveu, das lutas que batalhou, mas não num tom fúnebre, apesar de sabermos seu fim logo no início. A autora consegue se equilibrar no que parece ser uma dor, uma saudade de algo que se perdeu e de uma forma de viver, como ela coloca, da vida das 'pessoas simples'. E é aí que ela se torna magistral. As pessoas simples são seus pais, os moradores da pequena cidade onde passou a infância e adolescência, os operários, as pessoas não burguesas, as pessoas que não vivem de luxo ou envolvidas em arte, música, literatura, cinema, os intelectuais - o que para o pai de Annie, eram a mesma coisa, dada a distância entre esses mundos.

Foto do Kindle aberto na capa do livro de Annie Ernaux, O lugar.
O lugar, de Annie Ernaux

São pessoas de costumes comuns, sem soberba, como muitos brasileiros, como os pais dos meus avós, como meus avós, em grande parte. São pessoas que batalharam para que seus filhos pudessem ter uma vida mais confortável e o acesso à melhor educação possível. Que vivessem com privilégios que eles mesmos não tiveram, criando oportunidades para que os mais novos habitassem outra realidade que, por fim, triste e ironicamente, determinava um afastamento entre todos. Essa separação é ainda mais evidente quando a autora se casa com um rapaz de sua vida adulta, distante fisicamente e socialmente de seus pais, agudizando as diferenças. Isso se percebe especialmente no cuidado embaraçado dos pais com os visitantes, como se o uso de polissílabos e citações daqueles os tornassem cidadãos de primeira classe e os demais estivessem a seu serviço sem reconhecimento.

"Uma ideia fixa: “O que vão pensar da gente?” (os vizinhos, os clientes, todo mundo). A regra básica era sempre dar um jeito de escapar à crítica dos outros, sendo muito educado, não emitindo opiniões, ou vigiando o tempo todo o próprio temperamento, para não deixar escapar nada que pudesse ser julgado pelos outros."

Sem oposição, a autora narra com uma tentativa de distância a história do pai, mas, em intervalos irregulares, questiona este trabalho, os sentimentos, a diferença entre eles, a perda iminente e já conhecida com um sentimento maior do que ela suportaria, que ela suprime em frases esfriadas à força. E, mesmo sendo o assunto que mais me aterroriza na vida e do qual eu sempre me afasto em qualquer forma em que o conteúdo se apresente, entrei nesse livro com uma voracidade e o terminei em pouco mais de 12 horas, considerando aí a noite de sono. Talvez por saber o futuro da história, o que restava a conhecer era a vida do personagem e não sua morte. Talvez isso tenha me salvado, talvez a narrativa de forma simples e sentimentos complexos, talvez por falar sobre família e cuidado. Talvez por, ao falar do pai, é a força da mãe que se sobrepõe, como alguém que é sempre o ponto forte da família, a estrutura que os mantém juntos de alguma maneira.

Fotografia atual de Annie Ernaux, escritora francesa, prêmio Nobel de Literatura em 2022.
Annie Ernaux
Annie Ernaux não me deixou leve com esse livro, mas me fez ver, claramente, como ela supera a premiação que lhe foi dada. Enquanto escrevo, já penso na sequência, no livro seguinte dela que trará suas histórias reais, de memória de família e que reverberarão em mim com aquela profundidade que nos aperta o peito, ao mesmo tempo que nos abre um sorriso íntimo de satisfação, de sair da zona de conforto e nos fazer pensar em nós, em nossa história de vida e familiar, nas nossas pessoas simples e como, sem o que foi e é a vida delas, nada seríamos hoje.

"Não pensava no fim do meu livro. Agora eu sei que ele se aproxima. O calor chegou no começo de junho. Só de respirar pela manhã, dá para saber que fará um dia bonito. Logo não terei mais nada para escrever. Queria adiar as últimas páginas, queria que elas pudessem estar sempre à minha frente. Mas não é possível voltar muito atrás, corrigir ou acrescentar coisas, e nem mesmo me perguntar onde estava a felicidade."

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Retomando a vida no Café, encontramos Chico Buarque em seu Leite Derramado. Meu primeiro livro do compositor e cantor, uma experiência interessante que trouxe o que pensar. De narrativa leve e atravessada pela história do país, vale as ideias que desperta, sempre com um cafezinho ao lado.

livro=leite-derramado-chico-buarque



Leite Derramado veio através do meu trabalho de curadoria de conteúdos para projetos audiovisuais como uma ideia e fui conhecer a obra. À primeira vista, empolgação: vem coisa boa, Chico Buarque, não tem como não ser bom. Mas, ao entender que a história é sobre um homem em uma cama de hospital, os pelos do braço se arrepiaram. Tenho um problema com o tema da morte e, em especial, por doenças. Provavelmente é marca de uma família com médicos e uma mãe que nos colocava para assistir a dramas pesados nos anos 90. Chego aqui para contar mais.

Eulálio é um senhor centenário em uma cama de hospital que narra suas memórias para alguém. Este alguém varia: sua filha, a enfermeira, o auxiliar de enfermagem, quem estiver passando. As lembranças atravessam a história do país e do mundo em guerras, ditadura, império, escravidão, economia e outros temas por um viés muito particular. Este é um ganho na trama, histórias pessoais que cruzam a grande História são a melhor forma de aproximar o leitor de uma realidade que lhe é estranha e, ao mesmo tempo, reconhecível.

capa do kindle do livro Leite Derramado, de Chico Buarque.

Eulálio apresenta sua família partindo do pai, um homem escravagista que se torna abolicionista e do avô português que emigrou ao Brasil junto com a corte nos idos das ameaças de Napoleão. Ele próprio assume ser, com orgulho, de uma família abastada e marca isso por toda a narrativa, também trazendo a mãe burguesa e controladora, mas já assume, com o passar dos anos, que era como um esnobe ou ex-nobre. Encontramos o grande amor de sua vida, Matilde, cria de cozinha de uma família de pessoas brancas e que, ele mesmo, tem dificuldades em enxergar sua cor e origem. Para o protagonista, ela era irmã das outras meninas daquela família, estudavam na mesma escola no Rio de Janeiro e seu francês arrastado era um charme.. Matilde nos acompanha durante toda a trama pela voz dele e pela falta que ela lhe faz, desaparecida há décadas.

Além dela, vemos o discorrer de sua família em decadência moral, social e financeira. A filha que apanha do marido e perde parte da fortuna, a história dos varões da família sempre com o mesmo nome e derrocada em tráfico, vida sem trabalho na base do jeitinho. A moradia é uma presença na trama, é um dos marcos das finanças em falta por golpes, roubos, ausência de administração e cuidado de todos. A falta de estrutura sólida familiar os leva organicamente a um fracasso generalizado como a todos que, acostumados a uma vida de bonança sem esforço, esquecem de precaver-se contra tormentas.

A graça do livro está na maestria da linguagem. A narrativa memorialista faz sentido ao homem que se perde em devaneios, repete histórias, muda a ordem dos acontecimentos. É interessante ler a amarração da trama, pois nos traz à mente as nossas próprias memórias, tecidas a partir dos sentimentos e sensações. Quando uma lembrança ressurge, nunca é em sentido cronológico como em um livro biográfico, mas parte de um cheiro, uma palavra, música, paladar, afeto. É daí que resgatamos as emoções que trazem o passado, a pessoa, o bicho de estimação, uma viagem, ao presente.

Imagem de rosto de Chico Buarque de Holanda. Autor de Leite Derramado.

É isso o que Chico Buarque faz tão bem. A falação foca no que marcou mais a vida do protagonista e, ainda assim, constrói uma história que nos faz querer saber mais, pela própria forma de contar. Propositadamente, Eulálio se confunde com quem lhe escuta e pode soar perdido e aéreo, como muitos idosos em condição similar. E como muitos idosos em situação similar, garante momentos de lucidez e precisão na escolha das palavras e pensamentos com uma clareza impressionante. O que importa é o que está dentro daquele homem, o que lhe pertence e que ele sente relevante compartilhar, entre os remédios que toma e o entorpecem, e exames de imagem. As memórias, o que o nosso organismo retém, é o que nos marca e molda.

Há um ponto que é próprio do protagonista e que nos deixa em alerta. É a história de um homem branco e velho da zona sul do Rio de Janeiro com suas marcas racistas da velha nobreza e machistas da cultura de então, ainda que pintadas com possíveis ironias e alguma humanidade. Dá uma sensação diferente ler o livro, entre o prazer da excelente escrita presa em um conteúdo que, por vezes, incomoda. Me senti em cima do muro, entre entender a ironia fina e a licença poética do autor em criar o personagem e deixar sair dele tantos descaminhos de época. Há um sentimento estranho no final da história, que nos deixa mais interessados em Matilde e no que falta saber dela, e também na derrocada familiar do que, em si, nas memórias perdidas de contexto de Eulálio.

Por fim, Leite Derramado é um título intrigante e seu significado é lindo e profundo quando chegamos a ele. Novamente, é de Matilde que falamos, de quem queremos saber sempre mais e de quem, como a Eulálio, sentiremos mais falta ao fecharmos o livro.

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maracanazo, maracanã, 1950
Maracanazo, 1950

No início da semana passada, estive pesquisando livros e autores que despertassem o olhar para uma história interessante e com uma narrativa fluida em que as imagens viessem fáceis, como se estivéssemos vendo um filme se desenrolar a cada página. O algoritmo universal me levou a Empate, de Vinícius Neves Mariano, livro que devorei em poucas horas com muita alegria e novas ideias.

O ano é 1950, o momento, a final da Copa do Mundo, Brasil e Uruguai. É a estreia do Maracanã, construído especialmente para o evento - o maior estádio do mundo em seu primeiro momento de glória. O Brasil, como em todas as finais de campeonato, parou para ver o jogo. Estádio lotado, 200 mil pessoas. Duas delas estarão lá e não conseguirão ver nada.

imagem do Maracanã, em 1950 durante a final da copa do mundo, o Maracanazo
O Maracanã de 1950 é o cenário para o livro de Vinícius Neves Mariano

Como se estivessem em um pesadelo, dois homens caem no fosso que separa o campo da arquibancada. Um, manco e raivoso, injustiçado por ter lutado em uma guerra que não era sua, deseja ardentemente a derrota nacional e o outro, a esperança honesta em um trabalhador comum que só quer chegar ao fim do dia feliz, a vitória implacável sobre os vizinhos uruguaios. Com a narrativa dividida entre os soluços de uma torcida desesperada e eufórica, e flashbacks que reforçarão as razões do primeiro, seguimos ansiosos como se o jogo estivesse acontecendo diante de nós e não soubéssemos o resultado.

Tudo o que se ouve são ruídos, gritos, aplausos. O silêncio é sempre mais tenso e reforça a cena que se passa entre os dois. Como uma peça de teatro, tudo é a troca entre eles, e o futebol, ainda que importante enquanto contexto, não se sobrepõe às relações humanas que se descortinam diante de nós.
Capa do livro Empate, de Vinicius Neves Mariano
Empate, de Vinícius Neves Mariano

Vinícius Neves Mariano é preciso no contar de sua história e, no final, sentimos falta daqueles personagens, queremos saber mais sobre eles, queremos ficar talvez mais tempo, além daqueles pouco mais de 90 minutos de jogo. Ironicamente, este mesmo tempo contado é implacável, cronometrado ao fim do romance, do jogo e de qualquer coisa. É o tempo que determina tudo o que temos, fomos e somos. 

O autor foi uma grata surpresa pra mim, que investigarei seus outros escritos agora. Há outros dois livros a conhecer, o recente Velhos demais para morrer, e a experiência do instagram, Nenhum futuro próximo. Para saber mais, visite o site do autor.

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Vamos manter o blog sempre vivo? Com um valor tão pequeno quanto o de um cafezinho, você contribui para a manutenção deste espaço que traz sempre um conteúdo gostoso e quase sempre útil. :)

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É sempre suspeito pensar no que ler por um ano inteiro. Minha lista costuma se intercalar entre aqueles livros que desejo ler há algum tempo e surge o momento, outros que descubro pelo caminho e terceira e mais recente via: os que preciso ler para o trabalho. Com a pandemia e um distanciamento social que parece não ter fim, nesta metade de 2021 concluí meu desafio de leitura do Goodreads. Hoje é dia de trocar ideia sobre livros. :)

imagem de livros e o título: o que ler em 2021. post sobre livros lidos e o que vale a pena.

Todos os anos me proponho a ler uma quantidade de livros. A grosso modo, não significa muita coisa se você leu 5, 15 ou 50 livros em um ano. Não é uma avaliação qualitativa ou algo que mereça mérito de qualquer tipo. Eu considero o "desafio de leitura" como um número que eu ache alcançável e divertido tentar cumprir, um estímulo a buscar obras interessantes que estimulem o meu prazer pela leitura. Nos anos anteriores, me propus a ler mais e 2020, com o apocalipse que afetou a nossa saúde física e mental, não cheguei nem perto de atingir meus 37 propostos. Li 12 e não sofri com isso.

Este ano, baixei as expectativas, encarei a realidade da "Pandemia - ano 2" e fui em frente com meu barquinho literário, remando na paz e com meu café ao lado. Chegamos a fins de junho e, sem perceber, vi que li os 15 livros que havia me proposto para todo o ano. Vem mais por aí, mas, antes disso, mostro um pouco do que li e o que vale a pena.


Os que deram muito certo ❤

Um defeito de cor, Ana Maria Gonçalves

Da fantasia para a quase realidade. Este romance histórico traz a saga de uma mulher africana, levada criança como escrava e desembarcando na Bahia. Vivendo em Salvador boa parte de sua vida, este surpreende. É preciso respirar fundo para seguir com ele, é volumoso e me prendeu como uma série bem feita, em que ficamos tentados a ver tudo de uma só vez. Como grande parte da história se passa em minha cidade, para mim (e para quem conhece Salvador) fica a delícia de cruzar passado e presente e reconhecer naquelas linhas, os caminhos que percorro hoje. Além disso, é um livro com grande pesquisa histórica e cultural para se fazer crível. Para ler na rede.


Cidadão do Mundo, o legado de Sérgio Vieira de Mello, Matias Spektor

Amigo de longa data, Matias tem uma escrita - além de vasto conhecimento - fluida, que equilibra bem análise, conhecimento e uma leveza que quase tornaria qualquer assunto uma crônica. Em seus textos para jornais, traz ironias sofisticadas em forma de opinião e nos faz parecer até mais inteligentes do que somos. Em Cidadão do Mundo, ele traz um pouco da vida e relevância de Sergio Vieira de Mello, o diplomata brasileiro e adido da ONU que morreu em um atentado em Bagdá em 2003. Carismático, inteligente e conciliador, Sergio foi uma dessas personalidades que se foi cedo demais e deixou para sempre aberta a vaga de excelência que conquistou. Vale a leitura para conhecer, como me serviu, mais sobre a vida deste homem.


Imagem da cidade de Praga, República Tcheca, onde se passa a maior parte da história de Utz, livro de Bruce Chatwin.
Praga: a cidade mágica (da vida real) onde Utz acontece

Utz, Bruce Chatwin

Este livro surgiu, sendo sincera, numa promoção. O que não tira a sua qualidade, mas apenas a origem dele em minha vida. Inusitado, é um romance que trata da história de um colecionador de porcelana em Praga e como ele garantiu a segurança de sua coleção ao longo dos anos, atravessando guerras e regimes. Acho que o li até rápido demais e me pego tendo flashbacks de sua história. O livro traz muito da solidão dos personagens que escolhem o exílio social ou lhes é imposto de forma sutil. Ao mesmo tempo, traz as atrocidades de um regime que impõe o silêncio da repressão e a escuta é sabida. Para ler de uma só vez e se preparar para receber estas lufadas de sentimentos e lembranças depois. 


O livreiro do Alemão, Otávio Júnior

Uma história real, uma ideia para o trabalho. Descobri este livro em minhas investidas por histórias interessantes, relevantes e, se possível, reais. Encontrei Otávio Júnior, o verdadeiro livreiro do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro e sua história, este trecho de autobiografia, sobre sua paixão pelos livros, pela educação e por querer compartilhá-la com todos à sua volta. A história dele é vencedora, sua escrita é rápida e simples o que não diminui em nada seu talento e mensagem. Otávio é merecedor de todo apoio que conseguir, por seus objetivos e desejos de tornar o seu entorno, um lugar melhor para se viver. Uma história linda e que deve virar filme.


Tudo é Rio, Carla Madeira

Dos livros mais surpreendentes do ano. Tudo é Rio tem uma força voraz, arranca tudo de dentro da gente e nos faz pensar. Tem umas questões realmente a trabalhar ali, umas sensibilidades sobre ser mulher e relacionamentos, mas é forte e complexo, como a vida. Aí há a violência, a dor, o luto e o recomeço. Há amor, desamor, sexo, paixão e vingança. Há uma dona de casa, um marceneiro e uma prostituta. Um triângulo não amoroso e então, cheio de amor. Vai virar filme ou série com certeza, já foi dito por aí. Leia primeiro e vamos discutir. Tem uma resenha só pra ele aqui.

 

Foto do castelo de Bran, o Castelo do Conde Drácula.
O verdadeiro castelo do Conde Drácula, Romênia
Drácula, Bram Stocker

Sim, o clássico. Depois de ler Frankenstein e o Médico e o Monstro, e ter descoberto como são muito bons, a despeito de muitos filmes inspirados neles, fiquei com vontade de descobrir a grandiosidade do vampiro também muito conhecido entre nós. Bram Stocker traz um thriller - o livro é muito mais "de suspense" do que Frankenstein ou Dr. Jekyll, que poderiam facilmente ser categorizados como dramas "sérios" - e sua atmosfera é, de fato, bastante sombria. O livro é gostoso de ler, a história todos conhecemos, de um vampiro que precisa conquistar outros territórios para se manter eterno. A ideia de perenidade, de medo do invisível e do sobrenatural são muito bem tratadas aqui. Foi uma delícia entrar em um universo relativamente conhecido. 


Caçada ao maníaco do parque, Luísa Alcalde

Outro livro de trabalho. Vamos andar com esse, violento, real, que acompanha "em tempo real" a caçada ao maníaco do parque, aquele serial killer brasileiro que levava mulheres jovens para um parque à beira da cidade de São Paulo, as estuprava e matava. O maníaco segue vivo e preso, é um psicopata diagnosticado. Não é meu gênero de preferência, mas faz parte da vida e trabalho é trabalho. Ainda acho melhor ler estes do que histórias de gente que morre de doença, como os escritos por John Green.


A vida mentirosa dos adultos, Elena Ferrante

Ler Elena Ferrante é encontrar alguém de quem se gosta. Isso funciona comigo, quando passo a acompanhar o trabalho de um autor. Se ele for vivo, melhor ainda, porque esperamos novidades para os próximos anos. Neste, A vida mentirosa dos adultos, ela traz novamente uma protagonista napolitana em formação, uma adolescente vivendo entre as mentiras de seus pais e como isso parece transformá-la ao longo dos anos. Acho interessante é a visão de que os pais, quaisquer pais, não são, eternamente, os herois de nossas vidas, os exemplos de perfeição e correção, de honra ilibada e sensatez perene. Os adultos são jovens que cresceram. E, se a formação de base não for consistente e ancorada em valores e experiências que os reforcem, a fluidez da moral se torna constante e deslizes acontrecem. Eu gosto da ideia de tirar o peso  de 'exemplo' dos pais, mas entendo que é um momento extremamente marcante para quem a vive. Gosto de como a autora aborda isso, de como sua personagem percebe os adultos e como passa a se relacionar com eles e seus semelhantes, os jovens. O olhar apurado que parece ser tão específico de um protagonista, se torna um reflexo de parte do que vivemos e é isso que torna sua literatura tão especial. Se não conhece a autora, sugiro começar por A Amiga Genial.


imagem ilustrativa de bagagens em frente a uma casa, para um teto para dois, livro de beth o'leary
As bagagens que iniciam a história na Londres de Beth O'Leary

Um teto para dois, Beth O'Leary

Esse foi um acerto, levando em conta as expectativas. Não é um Orgulho e Preconceito, mas é uma literatura leve para tempos sombrios. É um romance romântico que pontua questões sérias como relacionamento abusivo de uma forma digerível, séria e sem pesar tanto o clima. Daria um ótimo filme. Se você gosta desse tipo de literatura, este é um acerto. A Pequena Jornalista já havia me falado sobre ele e, como ela sabe tudo de 'chick lit', fui na dela e me dei bem. 


A pequena livraria dos sonhos, Jenny Colgan

Adoro romances românticos. Minha investida por livros parte da vastidão de interesses em romances e comédias românticas que abundam tanto aqui, como nos filmes. Este livro é um alento. Leve, divertido, com uma história bem do jeito que eu gosto: café, livros, mudança de vida, viagem, mais livros e romance é de uma leveza tal sem ser bobo, que parece que estamos vendo um filme bom, só que é ainda melhor, porque dura mais para terminar. É dessas histórias que queremos que vire filme mesmo, na verdade, para compararmos a nossa imaginação com a dos outros. Jenny Colgan me levou para a Escócia e me deixou com saudades daqueles poucos dias que passei lá anos atrás. Me fez querer estar lá agora, naquele clima sempre inconstante e com paisagens magníficas. Se for sem preconceitos com literatura "de mulher", vai se divertir. 



Não é muito a minha, mas... 👀

Minha esposa tem a senha do meu celular, Carpinejar

É meu primeiro livro do autor. Leve, é uma série de crônicas sobre o casamento. Como o casamento deve ser, como o amor dele pela mulher é pleno, transparente, sincero. Como ele adora sua mulher e lhe tem confiança plena ao lhe ofertar, entre outras coisas, a senha do celular. Nâo sei. Terminei o livro, mas fiquei no meio do caminho. É como ler qualquer história sem conflitos, sem transformação do personagem. É como ver uma série expositiva, não tão narrativa. Achei morno. Entendo porque ele tem a atenção que recebe e acho que lhe seja devida. Acho que ele é como Martha Medeiros, que tem seu público. Talvez eu esperasse mais ironia, mais acidez e só encontrei doçura. O li para o trabalho e, para ele, atende as expectativas. Mas, para o meu lazer, não me pegou.

Imagem do Japão para representar Silêncio, o livro de Endo Shusaku
Uma viagem ao Japão medieval é o que fazemos neste Silêncio

Silêncio, Endo Shusaku

Este é o livro que deu origem ao filme homônimo de Martin Scorsese. Não vi o filme. O livro... não sei como veio para mim, deve ser coisa dos algoritmos. A premissa é boa: o questionamento de um padre missionário sobre o silêncio de Deus diante de uma situação difícil. O contexto é interessante, a catequização do Japão no século XVII e o encontro com uma cruzada contra o catolicismo. Há momentos interessantes, mas há um ciclo sem fim de repetição do padre sobre o silêncio de Deus e, por mais que a ladainha seja justificada, se perde numa ausência de ritmo e no pouco que sabemos sobre personagens relevantes na trama. O livro é bastante importante no Japão e bem colocado no mundo, mas acho que a trama se perde no meio do caminho ou se alarga para dar mais peso ao drama que se propõe do que à ideia que ensaia elaborar. Acho que esperava mais carga filosófica e não encontrei.


Ikigai: os cinco passos para encontrar seu propósito de vida e ser mais feliz, Ken Mogi

Então, aí eu achei esse. Disfarçado de sabedoria e cultura japonesa, é um auto ajuda que termina mal. Começa muito bem, na verdade, mas, com o andar da carruagem, se perde em encenação e o "resumo do livro no final do livro" me matou. Parece que era algo como: se você está com pressa, só leia as últimas páginas, mas escrito como: e então, segue o que vimos neste livro. Me irritou. Acho que subestima o leitor e não precisamos ser subestimados. Mas, os cinco passos são bem legais, traz um pouco de uma filosofia de vida japonesa que não conhecia e devo falar sobre isso em outro post. Tenho me voltado para questões saúde e viver melhor, naquele momento de pensar o que queremos para a vida, sabe? Então, para iniciar isso, o livro serviu. Se curtir a temática, vale a leitura sem grandes expectativas.


O ano em que disse sim: como dançar, ficar ao sol e ser sua própria pessoa, Shonda Rhimes

Este foi uma dica de uma colega de trabalho e, infelizmente, esperava mais. Entendi porque ela me sugeriu ler, Shonda Rhimes é uma entidade de força e produção audiovisual nos Estados Unidos e dominou as noites de quinta-feira, o prime time do prime time gringo por um tempo com Gray's Anatomy, Private Practice, Scandal e How to get away with murder. Pouca coisa, não? Ela escreve bem, obviamente, mas, não sei se foi a tradução (deveria ter lido em inglês) ou se foi porque o livro entrou, no meio de seu caminho, na prateleira de auto ajuda, que não tenho o hábito de frequentar. Então, li todo, claro, porque as referências de carreira me interessaram, mas parte daquela transformação pessoal não era muito a minha praia ou se repetia demais, talvez. Valeu por conhecer um pouco mais sobre essa grande mulher da nossa indústria, mas não indicaria como leitura por prazer.


Do jardim, com muito afeto: uma história tocante sobre uma amizade improvável, Ana Hantt

O título já indica o assunto, imagino eu. É mais uma tentativa de ler estes romances românticos conforme comentei acima. Só que esse... me pareceu simplista demais. Eu gosto de histórias românticas, sou romântica e etc, mas tem que ser bem escrito, senão fica parecendo filme feito para tv. E esse tinha uma ideia boa, mas pareceu um desenvolvimento apressado, curto, com resoluções fáceis demais. Enfim, sempre acho uma felicidade se conseguir uma publicação, escrever é difícil, toma tempo e, às vezes, a nossa ansiedade quer cortar este tempo de elaboração e partir para a ideia seguinte. Vai ver foi isso. Tem boas críticas no goodreads, mas me deixou insatisfeita. Não perca tempo.


E você, como estão as leituras neste ano ainda complicado demais para deifnir? Vamos trocar figurinhas literárias? =)

***

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O que vou escrever aqui pode parecer óbvio para muita gente, mas é um assunto que vem me acompanhando nas últimas semanas e, com o ano que estamos vivendo, imagino que atraia não apenas a mim. Vamos falar sobre propósito. Este é o início das postagens sobre estilo de vida, saúde, ócio criativo e o que mais surgir. Achei que as ideias de hoje valeriam a pena trazer para a mesa. Vamos tomar esse café?

Ikigai, estilo de vida, bem estar, mindfulness, pandemia e o que você tem a ver com isso


Outro dia, a palavra Ikigai surgiu para mim. Foi alguma pesquisa de internet e, como tenho me voltado para assuntos relacionados a estilo de vida, este conceito de filosofia de vida japonesa apareceu como uma fórmula simples, em teoria, de viver bem.

Dando uns passos para trás, será mais fácil entender. Meu trabalho atual é sobre conteúdo. De um lado, redijo textos e posts sobre diversos temas, incluindo saúde e doença, saúde mental e bem-estar. É um equilíbrio difícil de manter, especialmente quando não sou eu que escolho os tópicos e venho de uma família que trabalha na área, sendo todos um pouco excessivos na abordagem do tema, mas, estou acreditando que tem sido terapêutico.

Do outro lado, trabalho com projetos culturais diversos, desenvolvendo e estudando conteúdos. E, vou te falar, estamos numa fase pesada. Psicopatias, medos, transtornos mentais, assassinatos, serial killers, corrupção, pobreza. Os projetos se tornarão, com certeza, ótimos produtos, mas o desenvolver deles requer um aprofundamento em assuntos indigestos.

De alguma maneira, o contraponto veio: Ikigai. O livro escolhido foi: Ikigai - os cinco passos para encontrar seu propósito de vida e ser mais feliz, de Ken Mogi. Parece auto-ajuda e pode ser que seja mesmo.

A obra é facílima de ler, intercalei com o livro sobre um psicopata para dar uma equilibrada entre assassinatos horrorosos e formas de viver melhor. Em cinco tópicos, descobrimos algumas curiosidades sobre o Japão e esta filosofia, em como é expressada em atitudes práticas e tradicionais daquele país e como podem ser aplicadas por não japoneses. Achei as conclusões um pouco resumidas, mas falarei sobre isso depois. E, mesmo tendo acompanhado as recentes publicações sobre positividade tóxica e nunca concordei tanto com estas ideias (falarei sobre isso em outro post), este livro veio como um bálsamo em tempos sombrios.

O que chamei de assunto óbvio lá em cima foi a temática mesmo: como ser feliz, propósito de vida, como trilhar o seu caminho, viver no presente. Entre a minha crítica pessoal sobre livros de auto-ajuda e tendo recém lido este, fiquei no meio do caminho.

Acompanho as newsletters e o site de Maria Popova e ela trouxe algo que li hoje e se encaixa precisamente com estas ideias: ela fala sobre Kierkegaard e sua filosofia existencialista, selecionando trechos que trazem a fuga de si e do presente, como formas de ser infeliz. O que é, basicamente, o mesmo raciocínio de todas as filosofias de mindfulness, de Ikigai e de meditação do momento: viva o presente.

Há quem diga que a ansiedade é o medo do futuro e a depressão uma reação ao passado. Não sou psicóloga e jamais entrarei nessa discussão sem conhecimento de causa, mas, pensando de forma simplista, não me parece de todo errado. A ideia de se firmar no presente é uma tentativa de aliviar a carga do tempo, inexorável e dono de si e de todos. E, como uma força da natureza, é impossível vencê-lo, então precisamos facilitar a convivência e nos unirmos a ele, afinando o nosso com seu ritmo.

Com medo de parecer redundante, talvez seja essa a ideia dos existencialistas, do mindfulness, do ikigai, das meditações e exercícios de respiração. Talvez esse excesso de nomes para a mesma coisa seja um aspecto cultural, talvez seja estratégia de marketing, talvez os dois. Não custa pensar sobre o assunto e ver se ele contribui para o seu viver melhor. Eu acho que pensar no propósito como uma grande meta para a vida bem difícil e me parece um pouco definitivo demais. Se tirarmos o peso do objetivo final, de uma missão que compreenda todo o seu viver e focarmos no cotidiano, em pequenas ações que nos fazem bem, talvez consigamos um espaço para respirar e sermos um pouco carinhosos e menos críticos com a gente no dia a dia. É uma ideia.

***

Como eu disse lá em cima, este é começo de assuntos relacionados a estilo de vida. Ainda estou patinando na área e são reflexões pessoais, insights que talvez te interessem também. Em todo caso, para contribuir com a manutenção deste Café tão diverso e gostoso, você pode nos seguir nas redes sociais e manter a conversa ativa. Vamos?
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tudo é rio, livro de carla madeira. editora record. dica para dia das mães. um dos livros mais vendidos de 2021. romance, ficção.

Você se remexe da cadeira e vai para o sofá. Carrega o livro junto. Termina o trabalho, mas não consegue se desgrudar da tarefa, parte do que faz envolve ler. Tudo é Rio, de Carla Madeira entra nessa mistura de trabalho, lazer e paixão pelos livros. E esse, digo sem meias palavras, me remexeu por dentro.

O que a gente tem que buscar é a alegria, essa se esconde delicada na correria dos dias, não se oferece de pronto, quer ser encontrada, surpreendida, amada.

Chove em Salvador na última ou últimas semanas. Enquanto vemos o tempo passar pela janela e acompanhamos a transição das estações como quem aguarda o próximo trem com boas novidades, seguimos no dia a dia de muito trabalho e um pouco de expectativa. No meio de tudo, veio essa ideia que surgiu de uma newsletter literária: o livro Tudo é Rio, de Carla Madeira.

Depois, descobri sua fama entre os apaixonados por livros e histórias, mas só depois que li mesmo. Tenho andado menos midiática e mais imersa nos conteúdos do que nas resenhas. Alguma coisa se perde, outras se ganham.

E então, o livro. Li em dois ou três dias, terminei agora. Não vale a pena destrinchar a trama, é tão bem escrita, que vai perder a graça nas minhas palavras de opinião. Conto a sinopse um pouco como li: um triângulo amoroso entre um casal e uma prostituta, com uma tragédia entre eles. Não vá além disso, não busque resenhas, não invista em pesquisa. Compre o livro e boa viagem. E boa sorte.

Sorte sim. A sorte de ler um bom livro você já tem garantida, mas a de sair imune, já vai de cada um. Este é um livro de entranhas, que parece não mexer tanto com a gente de início, mas, fala tanto sobre vida e viver, que bagunça um pouco o nosso íntimo. Saí dele como saio dos melhores filmes, sem saber o que dizer ou como dizer. Tentando encontrar as palavras que deem conta destes sentimentos.

livro tudo é rio, carla madeira.

Quase cada frase de Carla Madeira é pensada e trabalhada, esculpida como o marceneiro da história, que monta móveis com a precisão de um amor complexo. Às vezes, são tantas, é tanta coisa bem feita que pensamos: me dá uma oração simples, para sair dessa avalanche. E ela vem, a frase simples. Vem carregada de desejo e de querer ser mais. E na sequência, outra artesania se impõe. Não confunda beleza com dificuldade. O livro é voraz, lemos rápido, as palavras correm para dentro da gente com uma velocidade de fome. A forma é que é bonita demais para passar despercebida.

A história parece óbvia nos primeiros... poucos capítulos. A trama, entretanto, se enreda de tal forma, que é possível ver um filme nisso tudo. Que seja bem feito e com o olhar de um Karim Ainouz. Só vi ele dirigindo isso, para ter a sensibilidade do que eu criei na minha cabeça. Quando a gente lê, a gente cria também.

Enfim, leiam esse livro, por favor. Quem gostar de livros, de romance, de literatura. Espero que gostem. É curto e intenso. É um pouco visceral, mas nada que te faça sangrar, eu acho. É íntimo, cheio de silêncios e fechado em si, nos abrindo para muito. Nos leva pra dentro e, que bom, nos faz ficar ali um tempo, viajando em outros desejos, quereres, histórias. Sempre querendo mais.

Espero que vire um filme.

***

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Este é o segundo dia das mães que passamos na pandemia. Alguns não têm acesso direto às suas mães por conta do isolamento e lhes resta, com isso, uma ligação, um carinho enviado à distância e com muita saudade. Então, trago dicas, tentando ajudar nestes encontros, da forma que der.

dicas do que fazer, assistir, ler, no dia das mães. para você e sua mãe. dicas de como preparar um dia das mães incrível

Fiquei pensando em uma imagem que trouxesse um pouco as minhas ideias e comecei buscando famílias, fotos de mães, mas interrompi este fluxo, da mesma forma que não queria listar, ainda que perca um pouco do público, 10 filmes para ver com sua mãe. Se colocar no google, verá, provavelmente, uns 40 sites fazendo isso. Queria algo que nos aproximasse mais, que trouxesse um pouco de ternura, porque mãe é isso: amor incondicional e ternura.

Assim, encontrei flores. Acho que dar flores é um ato de ternura. É de amor e carinho, claro, mas a ternura acho que traz uma gentileza junto, ternura é ato, mais do que sentimento pra mim. Então, vamos lá. Pensei em formas que se traduzam nesta gentileza, no afago, no abraço que queremos dar em nossas mães, independentemente das circunstâncias. Querer é tudo o que temos. Segue a lista!


Envie uma carta

Quando eu morava no Rio, minha mãe me enviou umas duas ou três cartas. Era uma forma que ela havia encontrado para falar das coisas do coração. Eu sei, quase ninguém recebe cartas que não sejam contas ou propaganda e, por isso, acho que seria uma grande novidade. Também troquei cartas com uma amiga que mora na Europa e é uma experiência. Nos sentimos um pouco como os escritores dos séculos passados, trocando correspondências, aguardando e trabalhando a ansiedade do correio. É, aliás, uma forma saudável de lidar com este sentimento. Se puder, envie uma carta para sua mãe. Custa muito pouco e você pode expressar nas suas palavras o quanto ela é importante para você, pode contar uma história, uma piada, falar da vida. A carta íntima dá uma liberdade incrível, e receber uma, é delicioso. É a certeza de que aquela pessoa se interessa por nós. De repente, some à carta, umas pétalas de flor, imagina a surpresa dela ao abrir?


Envie uma cesta de café da manhã

Se estiver com um pouquinho de grana, não precisa muita, envie uma cesta de café da manhã. Eu amo cafés da manhã. Acho que é aquele momento em que o dia está começando e há uma promessa de coisa boa no ar. Imagine sua mãe acordando com a campainha e aquele carinho em forma de comidinhas especiais esperando por ela? Com sorte, alguém até acordou antes dela e deixou em cima da mesa aquele embrulho grande e cheio de quitutes. Com certeza, será memorável para todos. Eu acho uma delícia de presente, literalmente. 


Assistam a um filme juntos

Vou passar uma lista de filmes para ver no dias das mães, mas a ideia é ir além. Se você tiver a sorte de encontrar com sua mãe em segurança, se vocês estiverem no mesmo isolamento social, vale assistir  juntos, alguma coisa que ela vai gostar. Pode até ser sobre maternidade... minha mãe, particularmente, adora a temática. Se não puderem ver juntos, combinem de ver o mesmo filme à distância e depois se liguem. O que importa, no fim das contas, é a cumplicidade e compartilhar momentos, certo? Segue uma lista com filmes filmes e séries para ver no dia das mães:

filme um inverno em nova york (the kindness of strangers). dica para o dia das mães 2021.

Um inverno em Nova York

Um inverno em Nova York significa mais em seu título original: The kindness of strangers. A trama é sobre esta mãe que foge para Nova York com os filhos. Enquanto o marido abusivo é policial e procura por ela, ela segue no amparo de estranhos, por sorte e encontrando essa gentileza do título, o cuidado de pessoas que cruzam o seu caminho. É um drama bonito, com personagens complexos e que quase se desenrola rápido demais. Dá vontade de seguir acompanhando aqueles personagens por mais tempo. Na netflix.

Que horas ela volta?

O filme conta a história de Val (Regina Casé), uma empregada doméstica pernambucana que trabalha para uma família de classe alta em São Paulo. Há anos no serviço, Val mora onde trabalha, recebe a notícia de que sua filha Jéssica (Camila Márdila) irá à cidade prestar o vestibular e sua chegada rompe com o equilíbrio da casa. O filme promove um retrato fiel não apenas da classe alta, como um recorte amplificado das diferenças sociais e a delicada relação entre família, patrão e empregado. Para saber mais sobre porque ver este filme, clique aqui! No telecine play.

Fatma

Esta série recém-lançada traz muito para nós. A produção é turca e se passa em Istambul. Fatma é uma faxineira que busca desesperadamente por seu marido, desaparecido após sair da prisão. Ele cumpriu pena em lugar de outra pessoa e sua integridade é o que faz Fatma percorrer este purgatório para dizer a ele que seu filho morreu. Como faxineira, Fatma é invisível nos círculos que habita, como serviçal, passa despercebida nos lugares, o que acaba por se tornar uma vantagem, quando ela vem a cometer alguns crimes por raiva e vingança. Assisti a série toda de uma só vez, como não faço há muito tempo. Cada episódio constrói um degrau de conhecimento dela sobre seu marido, sua situação e quem são as pessoas que estão ao seu redor. Intrigante, excepcional e com grandes atuações. Na netflix.

Supermães (workin moms) é uma dica de série do que assistir no dia das mães.

Supermães

Esta série canadense sobre jovens mães traz um grupo de apoio de mães, em que cada uma precisa lidar com uma rotina atribulada entre família, trabalho, relacionamentos e individualidade. Humor ácido, grandes diálogos e muita vida real. Sendo ou não mãe, sendo ou não mulher, tem pra todo mundo. Catherine Reitman é Kate Foster a protagonista. Ela é também a criadora e roteirista, além de ser mãe, de forma que sabe do que está falando. Uma curiosidade bacana é que Philip Sternberg, o marido de Kate Foster é casado na vida real com Catherine. Não suficiente tudo o que a mulher faz, ela ainda foi ao Tedx Talks. Segue link com a palestra em português. Na netflix.

Kramer vs Kramer

Ano passado, em homenagem ao dia das mães, eu compartilhei a lista de filmes de minha mãe. Ali, há vários filmes que eu e ela (mais ainda) amamos. Um deles é Kramer vs Kramer que, sempre vi e sempre verei. Conto um pouco o porquê: Dustin Hoffman e Meryl Streep. Encontramos este casal em crise. Joanna Kramer decide sair de casa e deixa Ted Kramer com a tarefa de conciliar o trabalho, a vida doméstica e a educação do filho ainda criança. O filme joga com essa relação homem x mulher, poderes e deveres, relações machistas e readaptação. É muito mais complexo do que um drama de divórcio e muito mais interessante também. É um dos melhores filmes feitos e é muito despretensioso, o que o torna mais especial. E convenhamos: Meryl Streep e Dustin Hoffman juntos não poderiam fazer um filme ruim. Levou os principais prêmios do Oscar de 1980 e está no google play e na apple tv.


Um livro para o dia das mães

Eu mesma me coloquei nessa enrascada... um livro apenas... vou trazer então dois, para equilibrar nos pesos, sentimentos e diferenças. O primeiro é o que li no início deste ano.

um defeito de cor e o amor é fogo. duas dicas de livros para o dia das mães.

Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves
Aqui, temos a saga de uma criança que sai da África para ser adulta, mulher e viver no Brasil. Em Salvador. Isso no que poderia ser o fim da escravidão mas era, ainda, o início dos movimentos abolicionistas. O livro é uma saga. É para ler com calma, é extenso. No meu caso, funcionou como uma série. Não senti dificuldade em maratonar suas mais de novecentas páginas e, mesmo parecendo um desafio quando comecei, li vorazmente. Dei uma olhada nos outros leitores blogueiros e, para a minha felicidade, tivemos impressões semelhantes. O livro é bem escrito, conta por uma perspectiva interessante a história de uma mulher que constrói sua vida com todas as adversidade possíveis. A pesquisa, com certeza, deve ter sido imensa, para dar conta dos detalhes culturais históricos entre os países. Dê para a sua mãe se ela tiver o hábito da leitura. Se não tiver, segue outra dica para ajudar a construí-lo:

O Amor é Fogo, de Nora Ephron

O livro virou o filme A difícil arte de amar. Novamente com Meryl Streep contracenando agora com Jack Nicholson, conta um período da vida da própria autora. Meio autobiográfico, meio romance, a narrativa é tão ou mais deliciosa do que o filme que a escritora roteiriza. O livro conta uma história agridoce sobre um casamento, do início ao que pode ser o seu fim, com uma intimidade de diálogos que impressiona. Nora é uma contadora nata e ela tem um humor peculiar, que nos faz rir como cúmplices de uma história nem sempre feliz. Com pouco menos de 200 páginas, dá pra ler numa sentada. Certamente sua mãe vai adorar.


Marque presença

A gente sabe que a vida não anda muito fácil. Se a sua mãe não estiver acessível para você, tenha certeza: ela está com saudades. Se um encontro físico não for possível, faça o que estiver a seu alcance: uma mensagem carinhosa, uma ligação, uma chamada de vídeo. Se puder, mande flores, um chocolatezinho ou alguma das opções que listei mais acima.

Se não puder, mande carinho, faça contato. Faça questão. Se a sua mãe for mãe mesmo, o que ela mais vai amar é o gesto. Pode ser um aceno da porta do prédio ou da casa. Pode ser um "só passei para dizer um oi de longe". O que importa é o ato. O carinho, a ternura. Tudo o que, com sorte, ela já fez e faz tanto por você.

***

Espero, de coração, ter inspirado um pouquinho a sua semana e que você consiga preparar alguma coisa legal para a sua mãe ou para as suas mães, se você tiver a sorte de ter mais de uma. Para me ajudar a manter este blog delicioso, dá uma passada no buy me a coffee! Cada cafezinho faz uma diferença danada e me estimula a seguir produzindo conteúdo para todos nós 💘

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Por que ler? Muitos escritores passam um tempo nesta questão, escrevem livros sobre seu processo criativo, a disciplina e o amor pela palavra escrita. Neste Dia Mundial do Livro, a conversa é leve, tentando responder como eu vejo a escrita, a leitura e a força das histórias. 

dia mundial do livro, imagem com livros abertos e o título: para viajar em 2021.

A literatura nos ensina a notar melhor a vida; praticamos isso
na vida, o que nos faz, por sua vez, ler melhor o detalhe na
literatura, o que, por sua vez, nos faz ler melhor a vida.
James Wood

 

Está difícil viajar este ano. Como meros brasileiros em tempos de pandemia, vamos nos concentrar no já repetido mantra "fique em casa". Tudo o que nos resta nestes 13 meses de isolamento e distanciamento sociais é pensar nas formas que temos de sair da nossa realidade, de buscar o lazer, de encontrar maneiras de retomar a criatividade.

Não, você não precisa ser um artista para ser criativo. Pode buscar em sua vida outras formas, perspectivas, ideias para o seu dia a dia. Isso é criar. Não significa produzir uma obra ou desenvolver um projeto artístico, necessariamente. E para isso, é preciso ter insumos.

Livros, filmes, conversas, séries, músicas, fotografias. Vale um mundo de coisas, mas, sendo o dia mundial do livro, vamos nos ater à palavra escrita e aos seus criadores. E, honestamente, nada se compara ao livro.

Sou graduada e trabalho com cinema e audiovisual de forma geral, então tenho esta forma de comunicação e arte em alta conta, mas o livro tem seu lugar. O livro demanda da nossa imaginação. É como nadar em alto mar e um filme... seria como boiar. No mar, você se aprofunda, investe em mergulhos, bebe um pouco de água salgada, os olhos ardem, mas a experiência é fantástica. Pode ser que uma tartaruga apareça ou um pequeno cardume passe por você. As algas, como os seus cabelos, podem nadar em sincronia, como se ouvissem uma sinfonia. No filme também aproveitamos, mas estamos voltados para o céu e só sentimos uma parte pequena do universo que é todo aquele azul profundo abaixo de nós.

É isso, o livro é um passaporte, um portal. É a nossa forma de atravessar, com a permissão do autor que nos entrega seu roteiro, paisagens, caminhos, tempos, histórias e pessoas. É conhecer novos horizontes, é recorrer aos nossos sentimentos, é criar as imagens para o que seguimos através do texto.

Você já riu com um livro? Já teve essa experiência? É das coisas mais maravilhosas e inesperadas. Da mesma maneira, quando o assunto é tenso ou pesado, vai em doses homeopáticas, porque não dá para aguentar muito de uma só vez. O livro mexe com as nossas entranhas, acalenta, aperta e afaga. 

O livro é um dos meios de ver o mundo e seus autores, os nossos guias. Que pessoas maravilhosas e mágicas são eles, que nos permitem reencontros de outras vidas e eras, uma conversa entre gerações, de vidas passadas e presentes. Talvez seja mais interessante pensar que se tornaram imortais mesmo, porque estão sempre ali, doidos para puxar assunto.

Este é um texto de amor, que deixei seguir fluindo, na esperança de trazer respostas. Eu leio porque gosto de viajar. Gosto de conhecer gente, lugares, outras vidas. Gosto de investigar saberes e sabores, e perceber que a vida é tão grande, diversa e rica, que nos ultrapassa, que precisa se espalhar e aí sim, contaminar todo mundo ao redor. É por isso também que eu escrevo, para compartilhar um pouco das minhas histórias cotidianas, querendo ouvir um pouco das suas também. 

Enquanto não saímos de casa, vamos aos livros, viajar, é preciso, por tão pouco, por todo o mundo.
Um feliz e maravilhoso dia mundial do livro para todos nós.

***

Eita que é falar de livro, eu me inspiro e não paro mais. Para me ajudar a trazer referências, autores e inspirações, vamos tomar um café? Vem no buy me a coffee! ☕
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A primavera começa oficialmente hoje, dia 22 de setembro. Para comemorar a estação mais bonita do ano, segue 12 dicas de filmes e séries, experiências de viagens, livros imperdíveis para ler em 2020 e coisas para fazer em casa, para fazer jus a este blog delicioso.


dicas-filmes-series-viagens

Esta é a minha estação favorita da vida. O que acontece na primavera é o desabrochar da vida como um todo, as flores e folhas ressurgem com a força da renovação, como se o ano começasse agora, com mais luz, dias um pouquinho mais longos, as brisas começando a amornar. Há um brilho diferente e um ar de coisa boa, de vontade de passear, de viver novas experiências e de reencontrar os amigos. A lista que vem aqui é em busca deste momento, entre os livros, filmes e séries imperdíveis para ler e assistir em 2020; lugares para conhecer e, estando em casa, algumas dicas para garantir uma temporada agradável.


Livros

O que você não pode deixar de ler em 2020

para-ler-em-2020
Livros para ler nesta primavera

Orgulho e Preconceito, Jane Austen. 

Indiquei outro dia, o filme Orgulho e Preconceito (2005), de Joe Wright no instagram do Café. O filme é magnífico, um romance bem construído para o cinema, baseado no livro homônimo de Jane Austen, um dos melhores que já li. Em Jane, o romance é mais aprofundado e a sua escrita é um pouco mais mordaz do que aparenta no filme. É como se Lizzie falasse pela autora, que também não acreditava em um casamento sem amor - e isso no século dezenove da Inglaterra rural. O texto ultrapassa a 'literatura de gênero' e é uma das obras mais importantes daquele país, além de ser uma delícia de ler. Leia o livro antes de ver o filme, se possível.


O Conto de Aia, Margaret Atwood.

Só agora atentei que minha seleção contempla livros que se tornaram filmes ou séries, mas não foi intencional. Li O Conto de Aia antes de saber da produção da série do Hulu e de toda a sua construção narrativa, de forma que construí em mim as imagens destas aias em uma distopia cruel e realista demais para chamarmos de ficção. As aias deste conto (que é um romance) são as mulheres utulizadas como reprodutoras em uma sociedade que se converteu a um absolutismo religioso cercado de ignorância e medo - termos que costumam andar juntos. Entre a revolta dos que parecem mais esclarecidos e um jogo de poder político e social opressor, o livro é violento, mas fundamental. A série traz a 'materialização' da obra escrita, trazendo ao grande público uma história importante, ainda que fictícia. De narrativa fácil e empolgante, oscilamos entre a dor das cenas de sofrimento das mulheres em nossas mentes e de suas revoluções, que nos instigam a continuar. Leia o livro e veja a série. Cenas fortes.


Órfãos do Eldorado, Milton Hatoum.

Vamos chegar um pouco mais perto da Amazônia em uma história nacional contada com maestria por um grande autor. É o livro mais curto dos três e traz um misticismo de uma região que nós, mesmo brasileiros, conhecemos pouco. Uma história de retorno à terra natal, reencontro familiar e histórias intricadas e obscuras, que nos deixam sem respirar até o fim. Escrevi sobre o livro e o filme de Guilherme Coelho, com Dira Paes e Daniel de Oliveira depois de ter conversado com o diretor. A crítica segue aqui e vale o investimento. 


Viagens

Três experiências imperdíveis em cidades maravilhosas para este ano

viagens-2020-budapeste
Experiências para a Primavera de 2020 | Budapeste

Orla do rio Danúbio, Budapeste

Alguns anos atrás fui à Europa com uma grande amiga. Escolhemos uma parte do leste do continente e desembarcamos em Budapeste. Essa cidade tomou meu coração e todas as outras por que passamos - Praga, Leipzig, Dresden, Berlim, Bratislava, Viena - pareceram menos importantes, mesmo sendo incríveis. Budapeste tem um 'ar diferente', como se andássemos sobre as páginas de um romance histórico. Caminhamos pela orla do Rio Danúbio, esta que vocês veem na foto e até ali é tudo apaixonante. De um lado da cidade, Buda, histórica com monumentos que remontam à idade média e do outro, atravessando a ponte das correntes, Peste, onde se destaca o Parlamento e há uma aura mais moderna, do império austro-húngaro. Um passeio para inaugurar a nossa primavera é acompanhar o outono deles, o clima é agradável e ainda distante do inverno brutal. Andar pela orla de Peste, próximo ao Parlamento é ver parte da história do mundo, no que este povo tão resiliente passou (os judeus eram empurrados para o rio na ocupação da segunda guerra mundial) e como eles se reergueram depois de tantos conflitos. Um passeio ao ar livre em uma cidade linda e tão complexa, é tudo o que precisamos nessa primavera.


Parque Lage, Rio de Janeiro

Voltando ao Brasil, desembarquemos na cidade que morei por doze anos, o Rio de Janeiro. Além dos passeios obrigatórios de quem visita a cidade - Jardim Botânico, Corcovado e Cristo, Pão de Açúcar, Orla de Copacabana de dia e Lapa à noite - vale visitar o vizinho do Jardim Botânico, o Parque Lage. Antes um engenho de cana de açúcar, posterior casa de aristocratas, o Parque Lage é hoje um parque público, tombado como patrimônio histórico e cultural da cidade. Menor do que seu vizinho imponente, este espaço abriga ampla vegetação, aleias para passeios sob a sombra de árvores, uma respeitada Escola de Artes Visuais, uma cafeteria e é palco de eventos de toda ordem: festas fechadas e abertas ao público, eventos de cinema e feiras livres de artes, comidas e bebidas artesanais. Um dos melhores passeios que o Rio oferece, de graça e para todas as idades. Ar puro, natureza em plena primavera e arte acessível. Para que mais?


Praia de Jaguaribe, Salvador

Voltei à minha cidade maravilhosa em março e, com toda a mudança de vida e pandemia, estou prestes a retornar à minha praia do coração, Jaguaribe (as praias foram reabertas esta semana apenas, depois de mais de cinco meses de espera, cautela e coração apertado). Jaguaribe não é a praia mais famosa da cidade, nem é a que sai nos cartões postais ou é listada como passeio obrigatório. Entretanto é, para mim, a mais deliciosa. Sua faixa de areia é extensa, na maré baixa é tranquila e na alta, com atenção, é um dos melhores banhos de mar. Há algumas barracas de praia meio arranjadas 'do jeito que dá', mas que ainda assim, suprem com as bebidas básicas e água de coco. Perto delas, ainda se encontra baianas de acarajé, ambulantes que vendem o picolé capelinha - tradicional da cidade - queijo coalho e outras 'iguarias' de praia. Na extensão característica do litoral soteropolitano, há uma amplidão quase a perder de vista: de Jaguaribe é possível ver Itapuã de um lado e a Boca do Rio do outro. Praia tranquila para passar o dia, surfar, nadar ou apenas conversar com os amigos, aproveitando a brisa constante e interminável que vem do mar de águas não geladas. Esta semana ainda inauguro a primavera por lá.


Filmes e Séries

Filmes e séries imperdíveis para começar a primavera do jeito certo!

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filme Enola Holmes | Netflix

Enola Holmes, Harry Bradbeer (2020) - Telecine

Milly Bobby Brown retorna à Netflix depois de algumas temporadas como a Eleven, de Stranger Things, agora como a irmã de ninguém menos que Sherlock Holmes. Intrépida, ela segue em busca da mãe desaparecida (Helena Bonham Carter). Com trilha sonora de Hole (de Courtney Love, a viúva de Kurt Cobain, do Nirvana), o filme estreia dia 23 de setembro e promete ser uma aventura gostosa, com roteiro criativo e animado para ver em família, em casa. Um filme recente e fresco, como esse ar novo que chega em nossas casas. Na netflix.


Jules e Jim, François Truffaut (1962) - Telecine

Um dos grandes nomes da nouvelle vague, François Truffaut é desses diretores amados da minha vida e da de muita gente, na verdade. Em Jules e Jim, temos estes dois amigos apaixonados pela mesma mulher, Catherine. Os três formam uma amizade complexa e nós circulamos entre ela, por seus diálogos, conversas, encontros e desencontros. Amor e amizade se entrelaçam em uma história única e deliciosa que marcou uma época e todas as pessoas que assistem este filme. Imperdível, clássico e atemporal. No telecine. 


Goop Lab, Gwyneth Paltrow (2020) - Netflix

Primavera é tempo de renovação, repensar os hábitos e reforçar a saúde com a chegada do calor e dias mais amenos. Para entrar no clima, vale assistir ao Goop Lab, um seriado comandado por Gwyneth Paltrow, a atriz hollywoodiana dona da Goop, uma empresa / revista de estilo de vida e bem estar. Para dar qualidade de vida aos seus funcionários, ela os leva a embarcar em experiências alternativas de bem estar e manutenção da saúde. Cada episódio traz uma prática diferente como mergulhos em um lago super gelado, outros sobre o uso terapêutico de ayahuasca, outro sobre sexualidade feminina e por aí vai. Nada disso lhe dará a garantia absoluta de uma vida melhor, mas vale como reflexão, se pensarmos em adequar determinadas práticas em nosso dia a dia. Para ver tomando o café da manhã. Na netflix.


Em casa

Dos benefícios da internet, links que vão melhorar a sua vida

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Being Water | Yoga e autoconhecimento

Being Water | Resiliência, consciência, generosidade e yoga

Quem me conhece, sabe que não sou adepta do universo da auto-ajuda. Entendo a relevância de quem busca se aprimorar ou buscar, literalmente, ajuda, nesta bibliografia, mas meus caminhos para isso são outros. Por sorte, tenho grandes amigos e amigas que contribuem para este processo das mais diversas formas e uma delas é Fernanda, uma amiga de longa data e para sempre. Nanda é o equilíbrio entre o 8 e o 80: é executiva de alta eficiência e é praticante e instrutora de Yoga. Juntas, estamos desenvolvendo seu projeto de vida, o Being Water, um site sobre qualidade de vida, práticas na natureza e muito conteúdo relevante e interessante para quem tem um pé no concreto e outro na terra. O site dela está em inglês - ela mora fora do Brasil há muitos anos - então para quem não lê no idioma, é só apertar aquele 'traduzir essa página' que o google oferece. Os conteúdos são excepcionais. Acesse o site, estreia hoje!

Lá do Sítio | Refeições vegetarianas e consciência ambiental

Maria Gambardelli e Daniel Lira são amigos que o Rio de Janeiro me deu. Trabalhamos juntos no grupo Globo e sempre foi um sonho de Maria aproveitar o sítio da família para a causa em que acredita e vive. A sustentabilidade, a consciência ecológica e política se uniram na forma como ela já se alimentava e alimenta há anos - é vegana - e o sonho virou muito trabalho e realidade. Lá do Sítio é sua empresa que fornece refeições vegetarianas e veganas, muita coisa que vem, efetivamente, do sítio de sua família, um lugar impressionante não só pela beleza, mas pelo cuidado no trato das plantas e animais - os cachorros maravilhosos que completam essa família - e pelos conhecimentos de Maria e Daniel sobre seu trabalho e sobre o cultivo e colheita. No instagram do Lá do Sítio, se você mora no Rio de Janeiro ou em Miguel Pereira, é possível encomendar as refeições (este não é um post publicitário), que são deliciosas ou, apenas, aprender mais sobre uma forma de viver mais em comunhão com a natureza e aplicar um pouco no seu dia a dia. Maria e Daniel, suas refeições e seu sítio, são das coisas que mais sinto falta estando longe. Passa lá no Lá do Sítio.

Visualize Value | Grandes ideias bem desenhadas   

Não conheço o designer de Visualize Value, esse perfil do instagram que descobri outro dia. Com não sei quantos seguidores e seguindo apenas seu criador, Jack Butcher, este produtor de conteúdo tem muito a dizer e o faz de forma contundente. Entre a natureza consciente de Maria e as práticas e reflexões de Fernanda, vale acompanhar o VV para ganhar estas pílulas de provocações do pensar. É coisa muito bem feita, que desperta nossa curiosidade e nos tira da mesmice. Melhor forma de viver a nova estação não há. Em inglês, mas fácil de entender. Vale a visita.

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Gostaram da lista? Têm mais sugestões de ligares e links para usarmos de forma produtiva e estratégica a internet? Cheguem mais, comentem e compartilhem com os amigos estas dicas incríveis. E, para quem gosta de um Café e quer me ajudar a manter este funcionando, passa aqui!
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Tati Reuter Ferreira

Baiana, curadora de projetos audiovisuais, escritora e crítica de cinema. Vivo de café, livros, cinema, viagens e praia. E Pituca.


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