Coragem
Não é sobre música. Coragem, primeiro documentário de
Sebastião Braga traz a história de Felipe de Luna e Diana Ligeti, aluno e
professora de violoncelo na capital paulista. Ele, bolsista da EMESP – Escola
de Música do Estado de São Paulo – vindo de um bairro de periferia e família
humilde, ela musicista romena que se divide entre Paris e São Paulo – a partir
do projeto da EMESP junto com o Conservatório de Paris – dando aulas e se
apresentando em concertos. Com tanto em comum, vamos descobrindo aos poucos
essa parceria e as vidas de nossos heróis.
Embora o filme seja permeado por
concertos e um ótimo tratamento de captação de som, além da reprodução de composições
clássicas e conhecidas que criam uma atmosfera interessante, a música é apenas
o contexto, pano de fundo para o tema do filme. Como o título indica, é preciso
ter Coragem para viver de música ou –
ainda melhor – para fazer uma escolha difícil e persistir nela, por acreditar
ser a única viável para a vida. Coragem também é a forma com que Diana sempre
se despede de seus alunos, um acalento, força vital para enfrentar um ramo
difícil sendo tão jovem.
Felipe fez sua mãe acreditar,
aprender a gostar de sua vocação que considerava irritante pela repetição nos
ensaios, sempre os mesmos trechos das músicas até a perfeição. Vivendo sozinha
e criando dois filhos, fez o que pôde para sustenta-los mesmo quando lhes
faltava o básico. O violoncelista em formação insistiu e, agora que enxerga uma
saída profissional se desenhando em um futuro próximo, enfrenta a ansiedade, as
expectativas e aquele medo guardado em nós, da grande mudança de vida. Esse
vislumbre de sucesso não significa certeza – ainda que seja quase previsível
devido à dedicação e talento – e a dúvida ele vence com os ensaios.
Diana já esteve em situação
similar. Escolhida para ser bolsista em Paris na derrocada da União Soviética –
antes a Romênia era parte da grande nação socialista sem abertura para o
ocidente em qualquer aspecto, especialmente no cultural – lá fez sua vida, com
a promessa de gerar oportunidades para jovens da mesma forma que conseguiu a
sua. Um encontro não casual formou a nova dupla e juntos, traçam seus caminhos
de diferentes aprendizados em reciprocidade.
Documentário de estreia de
Sebastião Braga, o filme se sustenta bem, acompanhando as rotinas dos
protagonistas em separado e quando se juntam, em um paralelo com quem já
alcançou um patamar e um conforto com a música e aquele que está trilhando seu
caminho, ainda que não seja iniciante. Cresce em quem assiste um orgulho ao ver
Felipe galgar patamares através do próprio esforço e dedicação, como um aluno
focado e persistente, que sabe o que quer e nos dá uma certeza de que
alcançará. Vemos em sua família esse mesmo olhar que brilha ao ver uma saída
positiva em um bairro carente e perigoso do subúrbio paulistano. Ao mesmo
tempo, é interessante ver que o filme amplia a perspectiva histórica e de
formação de Diana, que segue aprendendo e praticando, mesmo quando ensina a
seus alunos. É um filme que trata da troca de ensinos, perseverança e um
pouquinho de talento, item necessário, mas não fundamental ao aprimoramento de
qualquer um que se queira artista.




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