A guerra está declarada

by - janeiro 18, 2012

Na noite anterior também tinha ido ao cinema. Fui ver um filme leve, Românticos Anônimos. Estava decidida a pegar duas sessões, naquela ânsia de recuperar o tempo perdido nas férias e no corrido fim de ano, mas imaginei que o segundo filme ia acabar se impondo e eu perderia um pouco da graça do primeiro. Como previ, A Guerra está declarada é grande. Drama com tema difícil de abordar de forma criativa e que exige cuidado para não se tornar um daqueles arranca-lágrimas: um casal jovem se apaixona, casa e tem um filho. Descobrem que o bebê tem um tumor maligno no cérebro e a luta pela cura se inicia.

Éramos seis na sala de cinema. Eu e, na fila atrás, um grupo de amigos – da idade de meus pais – e um cara da minha idade, filho de um deles. Estávamos próximos e simpáticos, então engatamos conversa. O rapaz da minha idade não sabia sobre o que era o filme e quase me deu pena lhe contar a sinopse; de forma crua não parece muito estimulante. As luzes se apagaram e voltei pra tela. O filme é econômico: conta de forma dinâmica e divertida o início do romance e de como seus nomes Romeo e Juliette, indicam que alguma tragédia está por vir, mas estão dispostos a assumir o risco e a partir de então, já gostamos do casal. A simplicidade com que eles se encontram e se unem é tão gostosa e natural que quase estranhamos a dificuldade e os malabarismos que as pessoas criam ao se relacionar com outras na vida real.

O filme foi dirigido sob uma forma orgânica, a construção da intimidade do casal, sua consolidação, as decisões e a chegada do filho, tudo parece natural. A narrativa segue fluida para o espectador que se deixa levar solto, completamente entregue e cativado, mas esperando o momento trágico que virará a trama e a partir de então o mais importante; descobrir como será a reação dos heróis frente uma grande ameaça. Essa imposição da doença enquanto guerra é que passa a organizar o filme. A saída para a luta é planejada como uma estratégia de combate, dia após dia pensando em cada nova batalha e como vencê-la.

A voz em off é um inesperado ponto forte, quando nos indica o pensamento como uma conversa íntima; por vezes Romeo direciona seu olhar, seus gestos para Juliette e pensa para nós, o que não consegue lhe dizer em voz alta. Esse recurso substitui algumas falas e o filme se aproveita do silêncio que a tragédia impõe. O drama é claro e vivido de forma realística (vi num site a classificação como documentário), mas não se torna novelesco e não imprime com a música aquela carga que aperta nossos corações gratuitamente. A trilha está ali, tal qual a luta que eles decidem travar em família, como um imperativo: destaca os momentos-chave, em especial os de alegria e quase desaparece quando há muita tensão; essa jogada mostra a maturidade da obra e realça seu valor: a história já é dolorosa por si só e forte o suficiente para se sustentar com poucos e inteligentes artifícios.

Os atores que fazem o casal merecem e ganharam prêmios por suas atuações. Juliette é Valèrie Donzelli que ainda assina a direção e o roteiro e Jérémie Elkaïm é também roteirista e protagonista. A história é baseada em fatos reais e faz parte da vida deles, que tiveram o filho doente. É por isso e pela incrível força dos atores/autores que o filme se torna tão marcante. A descoberta da doença, o comportamento que eles assumem, a postura positiva diante de cada desafio são quase surreais se pensarmos no histórico dos filmes de doenças. E são justamente os protagonistas da história real que a recontam na ficção. A verossimilhança agradece e aplaude não só a obra, como o que deve ter sido viver fora dela. O filme é o eleito pela França para concorrer ao Oscar 2012 de filme estrangeiro. Forte candidato, já levou três prêmios no Festival Intenacional de Gijón, na Espanha, passou por aqui no Festival do Rio e abriu a Semana da Crítica do Festival de Cannes.

Quando saí do cinema reencontrei meus colegas de sala. Estava calada e pensando tanto na história que o filme me trouxe quanto em como ele foi feito. A história e a sensação pesavam mais do que essa ideia de construção da obra naquele momento – até porque não tinha me tocado que os atores eram autores – mas acho que é isso que torna o filme especial; deixar essas reminiscências. Me despedi do pessoal e o rapaz me perguntou se eu falaria bem ou mal do filme. Não poderia escrever de outra forma: o filme é excelente.

Título Original: La guerre est déclarée
Direção: Valérie Donzelli
2011 / França / 100 min
O trailer está aqui!


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2 Comentários

  1. Tati esse é o filme! incrivel seu comentário, espero em breve poder assistir . bjus
    Mams

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  2. Nada melhor para celebrar uma "guerra" vencida, do que fazer um filme para expurgá-la de vez.

    Bjos

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