Sono vence.

by - fevereiro 04, 2009

Mais uma vez ferve o Rio de Janeiro. Enquanto escrevo de uma sala de reunião, o calor entra pela varanda e surrealmente insisto em tomar café quente. Passam dos 35° e tive que sair do ônibus atrás de um táxi emergencial para não chegar aqui derretendo. O táxi me salvou com o ar condicionado e minha aparência venceu o termômetro.

Antes disso, um menino, possível japonês, sentou ao meu lado no coletivo. Sempre escolho as cadeiras altas porque ventila mais e nem sempre encontro ônibus com ar condicionado. Um dia terei carro novamente. O negócio é que o japa estava do meu lado, entendendo como japa uma suposição, pelo fato dele arranhar no inglês e o amigo dele perguntar algo sobre Hiroshima. O fato é que, com o japa do meu lado e quatro meninas em pé, seguíamos nosso destino comum. As quatro meninas me fizeram lembrar de mim mesma na idade delas, já que uma se parecia bastante comigo. Acho que perdi muito tempo me divertindo com as conversas das garotas e o jeito de falar delas... adolescentes são muito parecidas em quase qualquer lugar do mundo.

Um ônibus pára ao nosso lado. As meninas continuavam a falar e o japa tinha sacado do bolso um guia do Rio para japas. O ônibus ao lado também cozinhava pessoas. Janelas passaram por nós e pude ver uma senhora gordinha, igual a um cuscuz, só que bronzeado. Tinha voltado da praia e vi que no seu cabelo ainda tinha areia. Fiquei nervosa. Fiquei pensando em como eu tinha sorte de não estar ao lado dela. Não suficiente, na janela atrás dessa, um rapaz de seus vinte e tantos, venceu surpreendentemente o calor ou foi vencido por ele, ainda não decidi. O que importa é que ele dormia a sono solto, com o rosto colado no vidro da janela, fazendo aquelas nuvenzinhas de vapor que dão um aspecto meio podre na cena toda.

A situação foi tão insólita e eu estava tão distraída, que comecei a rir sozinha. O rapaz da janela estava com a boca muito aberta, como se o mestre dos magos tivesse lhe dado a poção do sono e ele automaticamente tivesse caído para o lado. O japa deve ter achado chato ou difícil desvendar os próprios rabiscos, porque acabou rindo sozinho da mesma situação que eu e aquele sentimento de compartilhamento passou por nós. Se eu gostasse da japas, teria sido aquelas cenas de amor à primeira vista dos filmes, em que dividir um momento acaba virando dividir a vida no fim da história. O japa até tentou pegar a câmera pra tirar uma foto, mas demorou demais e o ônibus resolveu acabar com o exibicionismo de seus clientes, indo embora.

No fim da história fiquei pensando em como meu ônibus era mais arrumadinho de pessoas, em como a gordinha cuscuz deveria estar agoniada (eu estaria... ou melhor, jamais ficaria suja de praia desse jeito) e em como o sono venceu o calor, o vidro da janela e o cheiro da praia. Definitivamente eu tinha muita sorte de estar no ônibus ao lado.

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